domingo, 10 de setembro de 2006

O Portugal dos pequenitos

Bandeiras. Confesso que não sou muito dado a adornos nem a competições de portuguesismo, mas gosto de as ver nas janelas. Não sou nacionalista, mas adoro o meu país. Gosto das nossas gentes, das peculiaridades dos portugueses. Temos defeitos, é certo – muitos mesmo, talvez demais –, mas também possuímos virtudes únicas.
No estrangeiro é fácil reconhecer um português mesmo sem o ouvir falar ou a falar outra língua. (E não, não é por estar a comer sardinha assada e a beber vinho tinto.) Mesmo que os portugueses estejam “descaracterizados”, digamos assim, rapidamente os identificamos.
Primeiro, pela fisionomia: olhamos-lhe para a cara e dizemos “aquele é português!”. Mas cuidado, pode ser turco. Turco? Sim, turco. Segundo João Ferreira do Amaral houve povos que na antiguidade pré-clássica (II milénio antes de Cristo) se deslocaram da Anatólia (mais ou menos na actual Turquia, para não complicar) e se instalaram no espaço que hoje é Portugal. E, de facto, embora muita gente o negue, a verdade é que somos parecidos, tipo “tromba de um, focinho do outro”.
Depois, pela irreverência divertida que nos caracteriza. Se virmos um homem a beijar uma estátua ou uma mulher a apalpar uma armadura de um guerreiro medievo, é forte a probabilidade de ele e ela serem portugueses. E esta não falha: se ouvirem uma sonora gargalhada num museu em que todos cochicham para não perturbar o deslumbramento com a arte, tal ruidosa forma de rir é, seguramente, portuguesa.
Este povo, rico em contrastes, uniu-se recentemente em torno de emoções fortes: o futebol. Lá tivemos, uma vez na vida, algumas razões de alegria (embora até da tristeza saibamos rir). Desfraldámos bandeiras, colorimos o país no orgulho da portugalidade… Mas não todos!
Alguns de nós, que passam a vida no autocomprazimento e na lamentação, entenderam que só punham bandeiras quando Portugal isto, quando Portugal aquilo ou quando Portugal aqueloutro. Outros pretenderam considerar menores aqueles que se emocionam com o futebol, considerando “escandaloso” que algumas empresas mudassem turnos de produção para permitir o visionamento do Portugal – México. Para eles, somos o Portugal dos Pequenitos, com resquícios de Terceiro Mundo, incultos, grosseiros e sabe‑se lá que mais…
Tais seres, do alto da sua superioridade, parecem não compreender coisas elementares: não são os pequenitos os culpados das nossas insuficiências. Os pequenitos, afinal, sabem reconhecer a excelência onde ela existe. E, no futebol, somos dos melhores.
Obrigado Scolari!


[Publicado no Jornal "Brados do Alentejo" em 14 de Julho de 2006 (http://bradosdoalentejo.com.sapo.pt)]

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