quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Intelectualidades

Fiquei sem saber se devia falar sobre o direito à mudança de opinião, se devia elogiar o conservadorismo bacoco que
recusa mudar de ideias (mesmo perante a evidência ou o mero acesso a novas informações) ou, por fim, se devia rebelar-me contra a intelectualidade dominante.
Enfim, posso apenas referir que foi o texto constante na imagem que junto que fez inflamar a espoleta. Leia, por favor, e depois, se fizer favor, queira voltar ao parágrafo seguinte...
Não sou pessoa de dar conselhos - até porque estes remetem sempre o meu imaginário para as públicas virtudes de hipócritas da pior espécie - mas o post acima sugere que se recomende aos jovens que se quiserem ser de esquerda que façam o favor de nunca, mas nunca mesmo, ousem mudar de opinião no futuro. Se o fizerem ficam sujeitos ao público juízo da sublime e suprema intelectualidade de esquerda, a qual faz de uso de palavrões como "ética" para atingir todos quantos ousem sair da linha.
São manifestamente injustas as acusações dirigidas a estes "reaccionários" que me merecem todo o respeito. Nem sempre concordo com António Barreto ou com Medina Carreira, mas as opiniões tanto de um como do outro devem ser levadas em conta (em especial porque já por várias vezes demonstraram estar certos apesar dos coros dos indignados do costume).
É por esta razão que, cada vez mais, sinto arrepios quando me falam de "intelectuais"... ou seja, de pessoas que limitam o uso do seu, alegado, intelecto a arma de combate político. Não que veja algum mal em que a intelectualidade seja usada na política; o que ela não pode é ser usada só desta forma e, particularmente, de forma subversiva ou de contrapoder. Se os intelectuais forem facto a massa crítica de uma sociedade, os motores da criatividade e da inovação para romper com a anacronia, então tais capacidades devem estar também do lado do Fazer e não, apenas, do lado do desfazer e da desdita. Dito de outra forma, a intelectualidade não pode ficar confinada às criações artísticas, às universidades ou à imprensa; é preciso ser colocada ao serviço das pessoas, da vida em sociedade e na esfera produtiva sem que seja acusada de estar a alienar os coitadinhos ou ao serviço de poderes ocultos e de interesses dissimulados. Para a intelectualidade de esquerda tudo se justifica numa imensa conspiração de meia dúzia de poderosos que maltratam cidadãos comuns, cidadãos esses que, se forem também de esquerda, são sempre vítimas inocentes a quem, em circunstância alguma, poderão ser assacadas responsabilidades.
Como Portinagio Greggio escreveu os "intelectuais viviam à margem da sociedade, em rodas boémias ou círculos de confrades, sem compromisso com a economia, a administração ou a política. Nessa situação de privilegiada irresponsabilidade, davam-se ao luxo de adoptar opiniões contrárias, comportamentos escandalosos e atitudes críticas. Tal conduta, longe de afastá-los dos que carregavam o peso da sociedade organizada, tornavam-nos ainda mais encantadores, emprestando-lhes exagerada aura de inteligência, de originalidade e de coragem".
Se era assim nos séculos XIX e XX, continua a ser assim no século XXI.
Ouvi outra máxima similar numa discussão exacerbada entre assalariados rurais de uma UCP em Santa Susana (Redondo) e um funcionário do partido descrito como "intelectual": "são esses gajos que nunca fizeram a ponta dum corno".




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