domingo, 4 de janeiro de 2015

Conversa da Treta

Isto é aquilo a que eu chamo "conversa da treta". A série humorística com a mesma designação tinha a virtude de nos fazer rir. Este argumentário — eu diria antes: este malabarismo com as palavras — pelo contrário, deixa-me triste e preocupado.

Num momento em que estamos prestes a inverter aquela ideia feita - e, infelizmente, até aqui verdadeira - de que aos grandes, aos detentores do poder, ninguém toca, eis que a meia dúzia de parolos saem à rua em defesa do ex-primeiro-ministro. Quer isto dizer que estou a presumir a culpabilidade de Sócrates? Não, quer tão-somente dizer que não descarto para já a hipótese de ele ser efectivamente culpado. E não terá direito à presunção de inocência? Claro que sim, assim como devem ser presumidos inocentes aqueles que tentam alterar o paradigma até aqui vigente de que a justiça não é igual para todos. Porque razão hei-de presumir que o Ministério Público e o Juiz de Instrução hão-de estar ao serviço de interesses obscuros, nomeadamente políticos? Porque hei-de acreditar que maquinaram uma prisão "em directo" deixando fugir informações que poderiam comprometer uma acção para a qual foi necessária muita coragem para empreender? Será que as fugas de informação terão vindo mesmo daqueles a quem esta Esquerda Unida tenta imputar responsabilidades sem qualquer prova?
Mas, afinal, quem é que esta gente quer proteger? Em coerência com a matiz ideológica que, alegadamente, subscrevem, penso que deveriam estar do lado dos descamisados e não, como tenho visto, dos poderosos.
Portanto, deixem lá prosseguir o processo Sócrates. Se se provar que o homem é inocente, libertem-no sem mácula e com remissão da sua imagem (se necessário for pela via pecuniária). Se se provar que as instâncias judiciais são culpadas pela forma, alegadamente, pouco cuidada com que conduziram o processo, então que tais instâncias sejam também elas responsabilizadas. Agora tentarem por todas as vias chafurdar o processo isso já não aceito.
Eu, no caso Sócrates, estou como aquele a quem colocaram como desafio lavar os dentes a um crocodilo do Nilo... garantiram-lhe que o animal era inofensivo, que não fazia mal nenhum, ao que ele terá respondido que não arriscava, sem com isso estar a querer pôr em causa a idoneidade do bicho.
Em outro artigo escrevi o seguinte (e com isto clarifico a minha posição):
"
Vamos ser razoáveis, se você disser que se deixar cair um ovo de galinha ele se parte ao embater no solo, talvez não precise de o demonstrar para que as pessoas acreditem em si. O que não faltarão são pessoas que podem testemunhar que presenciaram situações similares. Anormal seria o ovo não se partir. Agora diga-me uma coisa: já alguma vez comprou uma casa a uma empresa sedeada num espaço off shore (aqueles paraísos fiscais onde repousa dinheiro de que não se sabe quem é o dono)? Não? Olha que estranho! Nem conhece ninguém (na família ou entre amigos) que tenha comprado? Não? Então se calhar isto não é normal, logo, não é coisa evidente. Bom, mas deve estar farto de saber que habitualmente as pessoas vendem as casas por um valor menor que aquele que despenderam por elas, em especial quando o vendedor é uma empresa que visa o lucro? Também não? Bom, isto está difícil. Se calhar estamos perante uma situação que não só não é evidente como também apresenta indícios contraditórios com a ideia intuitiva que temos de empresa. Ora aqui está uma daquelas situações em que se queremos que as pessoas acreditem na nossa boa-fé e na nossa integridade moral, então vamos ter de nos disponibilizar, humildemente, para explicar tudo tintim-por-tintim
."
 
 

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