segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Com a devida vénia

O tema que escolhi para este fim de ano está relacionado com três crónicas anteriores, ainda que em diferentes graus e de formas também diversas. Foram elas: "Distância hierárquica", "Sufrágio universal" e, finalmente, "Autoavaliação". Chamem-lhe rebeldia se quiserem, mas tenho muita dificuldade em aceitar que algumas pessoas andem de cócoras em relação a outras se querem ter direito às boas graças das segundas. Quando eu era mais novo e, então como agora, me rebelava com tais situações, os anciãos diziam-me repetidas vezes que eu era assim porque era jovem e que, como tal, com a idade este "mal" acabaria por me passar. Mas não. Essas pessoas estavam enganadas. Acho mesmo que à medida que o tempo passa vou ficando cada vez "pior". Já explico porquê.

Sempre que me dizem que certos lugares de chefia não devem resultar de eleição mas sim de escolha ou de eleição (mitigada) por um colégio de ilustres, sinto que querem fazer de mim "pó-de-sapato". Tenho muita pena, mas isso não, embora reconheça que o que não falta é quem se predisponha facilmente a puxar o brilho ao calçado dos superiores. Também não me interessa se o PS e o PSD estão de acordo nesta matéria. O que me interessa é constatar que só através de eleição directa e universal se combate o despotismo e a concomitante servidão que lhe está associada. Só através de júris independentes de quem nomeia e sem interesses directos na nomeação se conseguem escolher os que são efectivamente melhores, preterindo os "preferidos" que são quase sempre potenciais cúmplices nas mais diversas falcatruas. Portanto, não me falem em directores de escolas escolhidos entre "ilustres". Não me falem de modelos de avaliação em que a opinião do superior hierárquico é determinante para o futuro do subordinado. Não me falem em concursos públicos viciados, em que se sabe à partida quem vai ganhar, na medida em que o júri é escolhido por quem nomeia. Para isso prefiro uma mera nomeação, que é seguramente menos hipócrita, desde que quem nomeia possa ser responsabilizado directa e pessoalmente por isso.

Falem-me de separação de poderes, colocando num plano a direcção política e estratégica e noutro a salvaguarda da legalidade. Falem-me de reitores ou presidentes de politécnicos eleitos por professores, alunos e funcionários, e de administradores escolhidos por um júri sorteado por entidade independente e constituído, exclusivamente, por outros administradores. Falem-me de presidentes de câmara eleitos directamente pelos cidadãos e de secretários municipais escolhidos em concurso similar ao que defendi para as universidades e politécnicos. Falem-me em Directores de Escola eleitos entre professores, alunos e funcionários – e que ele seja um professor está muito bem – mas falem-me duma gestão administrativa e financeira independente, escolhido entre pessoal dirigente livre e não subordinado à vénia. Falem-me de avaliação de desempenho em que predominam factores objectivos e não a opinião do notador.

E é assim, com a devida vénia, que desejo a todos os concidadãos Festas Felizes.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Segurança

Quando tomamos como referência outros locais, nomeadamente os grandes centros urbanos e, dentre estes, cidades como o Porto – que actualmente parece transformada na Chicago de Alphonse Capone – a resposta que se nos afigura mais imediata é: Estremoz é uma cidade segura!

Todavia, por detrás desta aparência serena poderse-ão esconder alguns aspectos que remetem a conclusão inicial para um outro patamar, nomeadamente levando-nos a concluir que a mesma, sem ser necessariamente muito má, é, no mínimo, precipitada. Admite-se que a maioria dos nossos concidadãos se sinta relativamente segura, não obstante oiçam falar, de vez em quando, em alguns assaltos a estabelecimentos comerciais. Em boa verdade, não é por aí que as pessoas em geral se sentem inseguras. Aliás, mesmo havendo registo da actuação de carteiristas "profissionais", desde que estes não ponham em risco a integridade física das vítimas, os cidadãos continuam a não ter medo de deambular pela cidade. Quando muito, passam a ter mais cuidado com as malas e carteiras.

Afinal, os que as pessoas temem são os assaltos à mão armada, os roubos por esticão, as violações ou os actos de vandalismo. E disso, felizmente, salvo melhor opinião, não temos registos relevantes.

No entanto, em especial para os jovens, a cidade já não é tão segura assim, pelo menos quando comparada com a Estremoz de outros tempos. Talvez eles, justamente por serem jovens e não terem termo de comparação, não façam alarde da situação, mas a verdade é que, por exemplo, quando vão aos bolos à Zona Industrial – um hábito de muitos deles que os mais velhos não tinham – o fazem em grupos de, por vezes, mais de dez elementos. E porquê? Porque é assim que se sentem seguros, protegendo-se reciprocamente. Por outro lado, a droga circula actualmente pela cidade de forma mais intensa que noutros tempos, estando a atingir níveis, a nosso ver, preocupantes. Se bem que nos estejamos a referir a drogas ditas leves, a verdade é que estas constituem o principal campo de recrutamento para as demais substâncias aditivas consideradas "pesadas". Se os nossos jovens convivem diariamente com esta realidade, começa a ser difícil que continuemos a considerar-nos "seguros".

Imigrantes

Deverão ser mais de 500 mil os cidadãos estrangeiros a residir em Portugal, dos quais cerca de 410 mil têm a sua situação perfeitamente regularizada perante o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Infelizmente, o número de imigrantes começou a diminuir de forma drástica em 2005, apontando os últimos números disponíveis para uma redução de quase de 50 mil cidadãos estrangeiros em apenas 2 anos (2005 e 2006). Enfatizo o infelizmente, porque quando Portugal deixa de ser bom para os imigrantes dificilmente continuará a sê-lo também para os cidadãos nacionais.

Apesar de tudo aquela cifra de 500 mil estrangeiros é significativa: corresponderão, grosso modo, a 5% da população total e a 10% da população activa. É muita gente e é também, numa perspectiva demográfica e económica, gente muito útil ao país. Desde logo porque consomem, gerando um acréscimo na pressão da procura que alimenta, sobremaneira, a actividade económica. Depois, porque a estrutura demográfica do país apresenta sinais evidentes de envelhecimento e os imigrantes são, em geral, jovens activos que contribuem para a redução do coeficiente de dependência dos idosos em relação aos jovens e para o rejuvenescimento do tecido humano do país. Quem nos dera a nós que os imigrantes se sintam confiantes para por cá se radicarem e que as gerações vindouras queiram ser portuguesas.

O maior medo que os nacionais sentem está relacionado com um eventual contributo negativo dos imigrantes para o desemprego. Do nosso ponto de vista tal receio tem uma pertinência manifestamente marginal, na medida em que os imigrantes têm sido a solução para o preenchimento de postos de trabalho que, não obstante existentes, estavam vagos há imenso tempo. Depois porque quando não há emprego para os nacionais também não há emprego para os estrangeiros e rapidamente estes voltam a migrar para outras regiões mais promissoras, não criando por isso maior pressão sobre o desemprego. Preocupante sim é o facto de sem eles a economia em geral ficar mais deprimida e desta forma criarem-se condições para que voltem a ser os portugueses a emigrar só que agora, ao contrário de no passado, serem os mais habilitados a fazerem-no.

Para os portugueses o mais dramático é Portugal, ao invés de atrair pessoas, ter voltado a ser um país de repulsão demográfica. Isso, sim, é preocupante.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

História do Presente

Floyd Mayweather Jr. e Ricky Hatton foram os dois nomes mais referidos pelos canais televisivos internacionais quando José Sócrates fazia, em directo, a declaração final da "histórica" cimeira Europa – África realizada no passado dia 8 de Dezembro. Na referida alocução, o Presidente em Exercício da União Europeia exagerou no enaltecimento dos resultados conseguidos. Do meu ponto de vista, não havia necessidade. De facto, momentos houve em que a classificação de "histórica" era intercalada em cada três palavras do seu discurso. Perdi a conta, mas foram para aí sete vezes, com a agravante de tais declarações terem sido entremeadas com mais dois "acontecimentos extraordinários", com outros tantos "sucessos" e, finalmente, como pelo menos um "foi um êxito".

Justifico agora a razão pela qual me referi em primeiro lugar a um outro nome que vai também, seguramente, ficar na História: Floyd Mayweather. Agora pergunto: trata-se de algum líder africano (daqueles que participaram na cimeira)? É Ministro de algum país europeu? Resposta: Não! É um afro-americano que no mesmo dia em que Sócrates escrevia as páginas da História estava a "ensinar boas maneiras" a um britânico pedante chamado Ricky Hatton, unificando os títulos mundiais de boxe na categoria de pesos médios. E o que tem isto a ver com a Cimeira UE – África? Nada! A única coisa em comum é que estes dois personagens eram a notícia em diferentes canais internacionais no exacto momento em que Sócrates falava da "sua" histórica cimeira, na respectiva sessão de encerramento. Uma de duas: ou as redacções das cadeias internacionais de televisão andam distraídas em relação aos temas mais prementes da actualidade; ou então não estavam a dar tanta importância assim ao feito histórico de Sócrates.

Deixem-me que agora refira que nos dias seguintes a imprensa escrita internacional também não comungou dos pontos de vista de Sócrates em relação aos resultados da cimeira. Na realidade, excepção feita a alguns jornais nacionais – e, ainda assim, não todos – a generalidade da imprensa escrita internacional acabou mesmo por ser severa na apreciação dos resultados, especulando eu que, provavelmente, foi justamente por Sócrates ter exagerado no auto-elogio. Conclusão: se Sócrates tivesse sido mais modesto nas suas considerações, provavelmente, (repito: provavelmente), o julgamento externo da cimeira teria acabado por ser significativamente mais simpático.

Ainda que não seja especialista em Psicologia, atrevo-me a considerar que as pessoas que enaltecem em excesso os seus próprios feitos acabam por evidenciar características de quem sofre de distúrbios do foro psicológico, nomeadamente de megalomania (ilusão de grandeza, que reputa todos os actos próprios de grandiosos). Como alguém dizia, "o auto-elogio é o substituto do elogio que não aconteceu". É, por assim dizer, o menosprezo da inteligência alheia. Logo, quem se sente ofendido por lhe terem dito algo do género "V. Exa. não sabe avaliar, logo eu avalio por si", é natural que reaja negativamente.

Concluo da seguinte forma: com menos prosápia e gabarolice a Cimeira UE – África teria tido maior sucesso.

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