sábado, 21 de outubro de 2006

Portugal vale a pena

Não resisti. Atendendo ao teor da minha crónica "A piolheira" (ad valorem: A piolheira), entendi por bem reproduzir aqui o artigo de Nicolau Santos na Revista Exportar. Penso que há que exaltar aquilo que temos de melhor.

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Portugal vale a pena
Eu conheço um país que tem uma das mais baixas taxas de mortalidade de recém- nascidos do mundo, melhor que a média da União Europeia.
Eu conheço um país onde tem sede uma empresa que é líder mundial de tecnologia de transformadores. Mas onde outra é líder mundial na produção de feltros para chapéus.
Eu conheço um país que tem uma empresa que inventa jogos para telemóveis e os vende para mais de meia centena de mercados. E que tem também outra empresa que concebeu um sistema através do qual você pode escolher, pelo seu telemóvel, a sala de cinema onde quer ir, o filme que quer ver e a cadeira onde se quer sentar.
Eu conheço um país que inventou um sistema biométrico de pagamentos nas bombas de gasolina e uma bilha de gás muito leve que já ganhou vários prémios internacionais. E que tem um dos melhores sistemas de Multibanco a nível mundial , onde se fazem operações que não é possível fazer na Alemanha, Inglaterra ou Estados Unidos. Que fez mesmo uma revolução no sistema financeiro e tem as melhores agências bancárias da Europa (três bancos nos cinco primeiros).
Eu conheço um país que está avançadíssimo na investigação da produção de energia através das ondas do mar. E que tem uma empresa que analisa o ADN de plantas e animais e envia os resultados para os clientes de toda a Europa por via informática.
Eu conheço um país que tem um conjunto de empresas que desenvolveram sistemas de gestão inovadores de clientes e de stocks, dirigidos a pequenas e médias empresas.
Eu conheço um país que conta com várias empresas a trabalhar para a NASA ou para outros clientes internacionais com o mesmo grau de exigência. Ou que desenvolveu um sistema muito cómodo de passar nas portagens das auto-estradas . Ou que vai lançar um medicamento anti-epiléptico no mercado mundial. Ou que é líder mundial na produção de rolhas de cortiça. Ou que produz um vinho que "bateu" em duas provas vários dos melhores vinhos espanhóis. E que conta já com um núcleo de várias empresas a trabalhar para a Agência Espacial Europeia. Ou que inventou e desenvolveu o melhor sistema mundial de pagamentos de cartões pré-pagos para telemóveis. E que está a construir ou já construiu um conjunto de projectos hoteleiros de excelente qualidade um pouco por todo o mundo.
O leitor, possivelmente, não reconhece neste País aquele em que vive - Portugal. Mas é verdade. Tudo o que leu acima foi feito por empresas fundadas por portugueses, desenvolvidas por portugueses, dirigidas por portugueses, com sede em Portugal, que funcionam com técnicos e trabalhadores portugueses. Chamam -se, por ordem, Efacec, Fepsa, Ydreams, Mobycomp, GALP, SIBS, BPI, BCP, Totta, BES, CGD, Stab Vida, Altitude Software, Primavera Software, Critical Software, Out Systems, WeDo, Brisa, Bial, Grupo Amorim, Quinta do Monte d'Oiro, Activespace Technologies, Deimos Engenharia, Lusospace, Skysoft, Space Services. E, obviamente, Portugal Telecom Inovação. Mas também dos grupos Pestana, Vila Galé, Porto Bay, BES Turismo e Amorim Turismo.
E depois há ainda grandes empresas multinacionais instaladas no País, mas dirigidas por portugueses, trabalhando com técnicos portugueses, que há anos e anos obtêm grande sucesso junto das casas mãe, como a Siemens Portugal, Bosch, Vulcano, Alcatel, BP Portugal, McDonalds (que desenvolveu em Portugal um sistema em tempo real que permite saber quantas refeições e de que tipo são vendidas em cada estabelecimento da cadeia norte-americana).
É este o País em que também vivemos. É este o País de sucesso que convive com o País estatisticamente sempre na cauda da Europa, sempre com péssimos índices na educação, e com problemas na saúde, no ambiente, etc.
Mas nós só falamos do País que está mal. Daquele que não acompanhou o progresso. Do que se atrasou em relação à média europeia. Está na altura de olharmos para o que de muito bom temos feito. De nos orgulharmos disso. De mostrarmos ao mundo os nossos sucessos - e não invariavelmente o que não corre bem, acompanhado por uma fotografia de uma velhinha vestida de preto, puxando pela arreata um burro que, por sua vez, puxa uma carroça cheia de palha. E ao mostrarmos ao mundo os nossos sucessos, não só futebolísticos, colocamo- nos também na situação de levar muitos outros portugueses a tentarem replicar o que de bom se tem feito.
Porque, na verdade, se os maus exemplos são imitados,porque não hão-de os bons serem também seguidos?
Nicolau Santos, Director - adjunto do Jornal Expresso
In Revista Exportar
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sexta-feira, 20 de outubro de 2006

Insegurança social

No dia em que escrevo a presente crónica completo 25 anos de descontos para impostos, pensões e assistência médica e medicamentosa. Quando iniciei a minha actividade profissional estava longe de imaginar o cenário com que hoje me deparo. Vi, como medida de combate ao desemprego, pessoas a reformarem‑se com 30 anos de serviço. Vi imensa gente a reformar‑se na casa dos 50 anitos e que andaram (alguns ainda andam) cerca de 30 anos a viver à conta do orçamento. Vi pessoas que passaram toda a vida a descontar pelo valor mínimo e que depois, a cinco anos da reforma, passaram a descontar com base em vencimentos fictícios e claramente inflacionados, adquirindo assim o direito a pensões de reforma claramente desproporcionadas em relação àquilo que efectivamente descontaram. Vi pessoas que compraram anos de reforma, pagando as respectivas contribuições, reformando-se logo de seguida. Vi um Ministro das Finanças que após uns mesitos no Banco de Portugal adquiriu o direito a uma pensão de uns milhares de euros bem chorudos. Assisti a isto tudo com a inocência dos ignorantes. Pensam que me revoltei quando vi pessoas a reformarem‑se daquela forma? Qual quê, até achei bem, cada um desenrasca-se o melhor que pode e não só eu no lugar deles faria o mesmo como só pensava que um dia – com o caminho que a coisa levava – eu iria reformar-me para aí ao fim de 25 anos de descontos, ou seja… agora. Estão a ver bem as figuras de parvo que, por vezes, fazemos sem querer? Estão a ver a irresponsabilidade que há em deixarmos os incompetentes decidirem o nosso destino? Estão a ver o que ganhamos quando fechamos os olhos a autênticos actos de pirataria do bem público? Ganhamos exactamente isto que agora temos como quase certo: andamos toda a nossa vida a descontar para as reformas dos outros e, quando a nossa vez chegar, o mais provável é que não haja ninguém a descontar para nós.
Aqui há alguns anos decidi que devia deixar de ser ignorante. Percebi que o conceito de “solidariedade intergeracional” – ou seja, os mais novos pagarem para os mais velhos – é a mais monumental treta do séc. XX e fiz contas: fiquei a saber que para uma esperança de vida de 75 anos, em termos médios, são necessários 43 anos de contribuições para se poder reclamar uma reforma por inteiro em relação ao último vencimento. Fiquei também a saber que se a esperança de vida for de 80 anos, já são precisos 47 anos ininterruptos de contribuições. Isto sem contar com o desemprego e com a assistência médica. Ficou para mim claro como a água que se as reformas dependessem das contribuições efectivas ninguém quereria fugir às suas responsabilidades; que se os subsídios de desemprego descontassem na reforma, ninguém quereria estar desempregado por mais tempo que o necessário para encontrar novo emprego. Ficou para mim igualmente claro que a solidariedade social terá de ser feita, necessariamente, através dos impostos.
Quero acreditar que ainda vamos a tempo.
[Publicado na edição do Jornal "Brados do Alentejo" de 20 de Outubro de 2006 (http://bradosdoalentejo.com.sapo.pt)]

sexta-feira, 6 de outubro de 2006

Venturas e desventuras no reino da fantasia

Ainda se ouviam os acordes dos Pink Floyd plenos de actualidade, “Money! Get away…”, quando Portugal viveu os efeitos do choque petrolífero de 1973. Por essa altura a gasolina subia de preço de forma vertiginosa todas as semanas, de 7$50 passou rapidamente para mais de 12$00 (uma subida de mais de 60%, em apenas alguns meses). O povo desesperava, a interrogação mais frequentemente ouvida era: “– Onde é que isto vai parar?”
Mas, lá está, os portugueses sempre souberam rir-se da adversidade e cá pelo burgo, no corso carnavalesco seguinte, parodiou-se com isso: “– Próxima semana gasolina mais barata: 7$50 o meio-litro!”. Não havia razões para temer a censura: era Carnaval, logo, ninguém podia levar a mal. As pessoas riam. Bem, alguns levaram o seu tempo a perceberem a piada. Lembro-me de um sujeito explicar a outro que agora quando fosse à bomba o primeiro meio-litro era mesmo mais barato, o segundo é que já era mais caro.
Este episódio veio-me à memória a propósito dos escalões da água de consumo em Estremoz. De facto, recentemente, a forma como passou a ser cobrada a água alterou‑se. O propósito inicial até era louvável dado que, antes, na era Mourinha, toda a água era cobrada ao preço do último escalão de consumo. Mesmo já no final do mandato, a anterior administração municipal ainda encetou uma ligeira nuance, fazendo com que todos pagassem os primeiros 4 metros cúbicos (em 2 meses) a um preço mixuruca. O actual executivo, quis acabar com tal injustiça. No actual sistema todos pagam os primeiros consumos ao mesmo preço médio, já que a tarifação ocorre, efectivamente, por escalões. Vai daí, restava apenas ajustar o preço de cada escalão em função da inflação.


E aí está o resultado na tabela anterior. De 16 para 17 cêntimos ou de 85 para 87 cêntimos a diferença é, de facto, mínima. Só há um pequeno detalhe: os actuais escalões correspondem a metade do volume dos anteriores. Resultado final: aqueles que consomem até 5 metros cúbicos por mês viram a sua factura agravada em 78%.
Questionado sobre este assunto na última reunião da Assembleia Municipal o presidente disse, e passo a citar com o devido destaque: “– …!” (fim de citação). Afinal ele sabe que, como alguém dizia, “mais vale ficar calado e parecer tolo do que falar e não deixar qualquer margem para dúvidas!”. Questionado sobre onde estavam registadas as dívidas de factoring, de que reincidentemente se queixa, ele disse exactamente o mesmo (não me obriguem a citar por causa da falta de espaço).
Em sua defesa acorreram pessoas que, menos experimentadas, desconhecem a citação anterior. Disseram que eram as “meias verdades” desta coluna que andavam a mentir e que a derrama só afecta as empresas com lucros. Pois bem, para quem vive no reino da fantasia, faço apenas duas recomendações: (1) perguntem às pessoas se andam, ou não, a pagar mais pela água; (2) perguntem aos empresários abrangidos pelo regime simplificado de tributação se não tiveram que pagar derrama, mesmo evidenciando prejuízos.
Repare‑se que nem sequer estão em causa as políticas adoptadas. Têm virtudes e defeitos como todas. O que esteve em causa quando escrevi as “meias verdades” foi faltar‑se à verdade, pensava eu, de forma deliberada.
Mais preocupado fiquei quando percebi que eles nem sequer faltaram à verdade com intenção. Não sabiam!

[Publicado na edição de 6 de Outubro de 2006 do Jornal Brados do Alentejo (
http://bradosdoalentejo.com.sapo.pt)]

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